Juiz de Sinop manda intimar presidente da França

Depois de alertar ao mundo sobre o desmatamento da Floresta Amazônica, o presidente da França, Emmanuel Macron, terá que explicar por que uma empresa majoritariamente do governo francês está promovendo incêndios na Amazônia. O responsável por apresentar o rigor da legislação ambiental brasileira ao chefe de Estado francês é o juiz da comarca de Sinop, Mirko Gianotte. Em uma decisão proferida nesta segunda-feira (3), o magistrado intimou Macron a prestar esclarecimentos sobre os danos ambientais que o seu país – de forma direta ou indireta – provocou na Amazônia Legal.

A provocação ao presidente francês está em vários trechos da sentença e foi uma iniciativa do próprio juiz. Ao julgar uma ação movida por entidades sem fins lucrativos, ligadas à preservação ambiental e à produção rural sustentável, contra a empresa que detém a concessão da Usina Hidrelétrica de Sinop, Mirko incluiu na lista de “responsáveis” o presidente francês. “Este Magistrado, ao longo de sua carreira, jamais se afastou das reclamações de sua sociedade, sempre se pautando de que a ‘Justiça pode ser cega, mas este Juiz não é surdo!’”, escreveu Mirko na decisão liminar. E o que o magistrado ouviu foi que o governo da França é o dono da maior fatia da Usina Hidrelétrica de Sinop. A reclamação das entidades que movem o processo é de que a partir do ano de 2018, diversos incêndios florestais foram registrados na região Norte da área de influência da usina. O argumento é de que esses incêndios foram provocados em razão da vegetação atingida pelo lago da usina, que não foi removida, morreu e se tornou um grande volume de material combustível. Com toda essa lenha seca, o fogo potencializou e se alastrou. Dados do INPE mostram que entre 2011 e 2017, essa região registrou 70 focos de calor (incêndios florestais). Já de 2018 à 2020, foram 173 focos registrados. As entidades culpam a usina pelo fogo, pedem investimentos em ações e programas de monitoramento de queimadas a título de compensação pelos estragos ambientais provocados.

Evocando as discussões da Rio 92 e os princípios ambientais que enfatizam a prevenção/precaução, em detrimento da reparação, Mirko considerou o pleito digno, dando um prazo de 30 dias para que todos os pontos reivindicados na ação fossem atendidos – aplicando uma multa diária de R$ 1 milhão a partir do prazo, em caso de descumprimento.

Ao citar a Carta Ambiental da França (2005), que diz que o Meio Ambiente é patrimônio comum dos seres humanos, Mirko começa a alçar a mira do seu “mosquete”. Por sua vontade, o magistrado enxerta no processo a informação de que 51% da Usina Hidrelétrica Sinop – portanto a maior fatia – pertence a EDF (Électricité de France), uma empresa estatal francesa convertida em sociedade anônima em 2004. Embora seja uma S/A, similar a Petrobrás, Mirko lembrou que 84,49% das ações da EDF são do governo da França. E foi assim que o magistrado arrastou Macron para o fórum de Sinop. “É de conhecimento nacional, que o Presidente da França, Monsieur Emmanuel Macron, defensor do meio ambiente e que tanto palpita nas questões ambientais no Governo Brasileiro tecendo inúmeras críticas sobre a proteção do meio ambiente no nosso País, relacionando, inclusive, recentemente, a grande produção de soja brasileira ao desmatamento da floresta amazônica, tenha, portanto, conhecimento da atuação da requerida [EDF] em solo Brasileiro, razão pela qual ordeno a expedição de carta rogatória à França, a fim de que o presidente se manifeste sobre a atuação da Usina no que toca às questões ambientais, em especial sobre os mencionados impactos ambientais que vem sendo causados no Brasil”, redigiu Mirko na sentença.

Para colocar ainda mais material comburente na sua decisão, o juiz encerra com o que poderia ser interpretado como um “puxão de orelha” de um inglês para um francês – nações cuja rivalidade remonta a Guerra dos 100 anos. O despacho do magistrado termina com a citação da “Honi soit qui mal y pense”, uma expressão em francês que significa “Envergonhe-se quem nisto vê malícia”. A expressão é o lema da Ordem da Jarreteira, uma ordem militar da cavalaria inglesa. “Honi soit qui mal y pense! Ceux qui rient à cette heure seront un jour très honorés d’agir de la même manière, car un tel acte sera mis en valeur de telle manière que même les moqueurs le rechercheront avidement! VIVE LE BRÉSIL!”, escreveu Mirko na última página da sentença.

Agora a intimação deve passar por uma tradução juramentada e encaminhada para o presidente Francês responder.

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