Delator diz que houve superfaturamentos em serviços prestados por instituto na saúde pública em Sinop e acusa sócios de receber propina

Dono da empresa Medclin, o médico e empresário Luiz Vagner Silveira Golembiousk afirma que desde o primeiro mês de prestação de serviços para a Prefeitura de Sinop houve pagamento de propina a integrantes de esquema de desvio na Saúde da cidade. As fraudes são apuradas na Operação Cartão-Postal, deflagrada nesta quinta-feira (19), que resultou no afastamento da secretária Daniela Galhardo e do procurador do município, Ivan Schneider, além de 6 mandados de prisão e outros 24 de busca e apreensão.

Segundo decisão obtida pelo Gazeta Digital, o delator Luiz Vagner prestou alguns depoimentos à Polícia Civil, nos meses de fevereiro e agosto deste ano. Nas oitivas ele detalhou como foi inserido no esquema criminoso e o funcionamento da fraude na saúde. Segundo ele, os serviços eram superfaturados e “todo mundo podia ver”, além de devolver parte do dinheiro recebido aos membros da organização.

Ele conta que a Medclin foi contratada pelo Instituto de Gestão de Políticas Públicas (IGPP) para Prestação de Serviços Médicos em Sinop. No começo do contrato, em outubro de 2022, o combinado era de a empresa ofertar médicos para atendimento nas unidades de saúde do município ao valor mensal de R$ 1.311 milhão. O acerto foi feito entre o delator e o advogado Hugo Florêncio de Castilho, responsável pela IGPP, uma Organização Social de Saúde (OSS), que gerenciava as unidades da cidade. O acordo foi proposto porque Hugo “não estava dando conta”.

Logo no primeiro mês, foi feito o pagamento com o valor combinado, mas Hugo pediu R$ 200 mil de retorno, depois o valor subiu para R$ 277 mil que deveriam ser depositados em contas variadas em remessas de até R$ 50 mil para não levantar suspeitas. Apesar de resistente, o delator pagou o solicitado por temer perder o contrato e já ter feito investimentos na cidade. Naquele mês, ele narra que o livro da empresa foi de cerca de R$ 340 mil após pagar os médicos e impostos, sendo que R$ 277 mil foram para o grupo criminoso.

“Isso está explícito para todo mundo, inclusive para o Tribunal de Contas. Recebe-se R$ 1.700,00 (por plantão) e paga R$ 1.200,00 (para o médico), tem R$ 500,00 aí que está desaparecido, tá em algum meio. Uma OS não pode ter lucro (…) então todo mundo sabe que é superfaturado”, disse ao justificar os valores além do praticado no mercado.

Delator ainda conta que cada pessoa tinha seu papel definido no grupo e que duas delas eram “superpoderosas”: Deise Juliani e Helena Maria Santos Barbosa. Deisi era o “Recursos Humanos” responsável pelos recebimentos, pagamentos e para dar “ar de regularidade” para que o esquema não fosse descoberto. Já Helena cuidava dos plantões e escalas médicas, além de ser responsável pela Unidade de Pronto Atendimento do Município (UPA).

Todos os meses seguintes foram de “retornos” ao grupo e o montante direcionado á figura a quem se referiam como “El Patron” ou “A pessoa”, que não é revelada na decisão. Depois, além de médicos, a Medclin também passou a fornecer aluguel de ambulâncias. Mas o empresário nunca assinou contatos, com o delatou.

“E eu falei: tá, mas cadê o contrato. Ele disse: ‘não se preocupa que o contrato a gente vê depois.’ (…) Foi onde surgiu uma mulher por nome de Roberta, que veio de Cuiabá pra ajudar a fazer todo esse contrato funcionar com locação de carro… mas eu nunca vi esse contrato. Eu nunca assinei esse contrato”, disse Hugo a Luiz Vagner. Ficou combinado entre ele e Hugo que o contrato das ambulâncias deveria render um total bruto de R$ 493 mil.

“Conclui-se, portanto, que a utilização do aluguel de ambulâncias serviria unicamente para obtenção de lucros, ignorando a qualidade do serviço prestado à população”, consta na decisão.

Delegacia Especializada de Combate à Corrupção (Deccor) apontou que há, desde junho de 2022, uma organização criminosa instalada e atuante na pasta. A organização é bem estruturada, com clara hierarquia, divisão de tarefas entre os componentes e com “sofisticado esquema de atuação em conexão com o Poder Público Municipal”, aponta a Deccor.

O esquema consiste em fraudar as prestações dos serviços de saúde da cidade, para ter lucro e realizar os repasses para os líderes do esquema.  A organização social tem sido ajustada para continuar na prestação do serviço, sendo alterada várias vezes em sua composição, no mesmo período que disputava a dispensa de licitação para assumir as atividades entre maio e junho de 2022.

Foi apontado ainda que a mesma organização venceu novas dispensas ocorridas entre outubro e novembro de 2022 e abril e maio de 2023, dando continuidade aos trabalhos na cidade até a presente data.

Conforme Só Notícias já informou, a Deccor da Polícia Civil investiga 6 empresas sediadas em Cuiabá, três em Sinop e outras em demais cidades por envolvimento nas fraudes e desvios de recursos na saúde pública sinopense. A justiça bloqueou R$ 84 milhões de bens dos investigados. São 31 alvos da operação Cartão Postal.

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